"O outro lado de mim me chama.
Os passos que eu ouço são meus" - Clarice Lispector
Não conseguindo mais duelar contra mim própria, entreguei-me.
É muito difícil ser pragmática quando a vida, a cada minuto, invade-me com experiências, emoções, sentimentos.
E, de outro lado, é muito difícil ser pura essência em um mundo onde estamos tão suscetíveis à dor, tristeza, violência e incontáveis outras coisas ruins.
Vendo-me, no passado, noto o brilho diferente nos olhos, a pureza no coração e aquela esperança inocente de que tudo daria certo. E que tudo seria belo.
Um dia a gente acorda e percebe que endureceu.
E, então, os romances lindos dos livros não comovem como antes, e se vamos ao cinema, optamos por uma comédia, porque rir ainda é algo que podemos fazer por nós mesmos.
A cada experiência ruim, cada frustração, meu outro lado morria um pouquinho.
Só que nem tudo se esvai, então, impotente, saí do casco e desabei, trazendo à tona todas as emoções que foram, propositalmente, contidas, ao longo da vida.
Dei-me conta de que o dano já estava feito, e me conformo com o fato de que jamais voltarei a ser aquela garota sonhadora. Pelo menos, não em público.
E é por isso que escrevo. Para me libertar das amarras que decidi criar para me poupar. Proteger-me.
Se você acha que me conhece pelos meus textos, engana-se. E se chegar a me conhecer, dirá que levo crédito por algo que não é meu. Ou, então, talvez, sugira que eu use um pseudônimo, haja vista tamanha discrepância entre a pessoa que vive no mundo real e a que escreve.
Quero que enxergue a escritora como uma outra versão de mim.
É meu outro lado, ressuscitado, aos poucos, em cada pensamento que sai da minha cabeça direto para as linhas do meu caderno.
Aquele lado que não está pronto, emocionalmente, para dar as caras, mas que ainda tem um resquício de esperança de que o mundo, algum dia, será um lugar mais lúdico, mais cheio de amor e de boas pessoas, onde a essência será capaz de fixar morada, sem nenhum receio.
By Milena Pelinson
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